Gabinete de Soluções

Desde início de sua trajetória como artista, ao participar da ação coletiva Atrocidades Maravilhosas, no ano 2000, o principal objeto de investigação de Guga Ferraz é a cidade. Há quase vinte anos trabalhando com intervenções em espaços públicos, o artista tem sua produção atravessada por questões como a violência urbana, problemas habitacionais, processos de exclusão na cidade, relações entre o indivíduo e o meio urbano e a própria cidade como lugar.

Vista da exposição

Graduado em Escultura pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Guga apresenta em seus trabalhos artísticos resquícios de sua passagem anterior pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, como o desejo de transformar o espaço urbano. Seus projetos, muitas vezes utópicos – como a reconstrução do Morro do Castelo, berço do Rio de Janeiro – só poderiam caber no domínio da arte, onde o experimental pode ser assumido sem moderação. Contudo, Guga sempre busca eliminar as fronteiras entre o poético e o funcional, explorando o potencial transformador da arte, e é disso que se trata esta exposição. Gabinete de Soluções evidencia a ideia de que o pensamento artístico pode contribuir para o desenvolvimento da cidade e para a criação de novas relações entre a população e a paisagem urbana.

Documentações e projetos

A mostra busca resignificar a ideia de “gabinete de crise”, comumente organizado pelas autoridades para atender a demandas urgentes. A crise é o status quo. Enraizada no cotidiano brasileiro, essa palavra tão repetida nas mídias de massa parece não provocar surpresa na população. Portanto, uma vez que evidenciar um estado de crise seria redundante, Guga Ferraz sugere soluções e convida o público a fazer o mesmo.

Conversa em torno do Bispo Caído

A exposição é composta por três núcleos: em um deles, observamos vestígios de interferências de Guga em espaços públicos, datadas desde o início de sua trajetória. Caracterizadas pelo tom denunciativo e crítico aos problemas urbanos, que permanecem os mesmos ou ganharam novos desdobramentos, a apresentação dessas intervenções produz uma pequena retrospectiva que visa apontar para a repetição e atualização das questões abordadas pelo artista ao longo das duas últimas décadas. A esses vestígios são somados trabalhos em diferentes meios – alguns inéditos e produzidos especialmente para a exposição – que evidenciam o olhar do artista sobre o meio urbano. Em outro eixo estão presentes sugestões de soluções do artista para a cidade, que exprimem formas de habitar, ocupar e reconfigurar o espaço urbano, algumas já executadas – apresentadas por meio de imagens – e outras que permanecem no âmbito projetual. Por fim, no terceiro núcleo, uma escultura em escala monumental, instalada ao fundo da exposição, celebra o Estado laico e contrasta com uma série de pequenas fotografias que contam uma história que aconteceu durante seu processo de criação. Esse contramonumento serve de ponto de encontro para conversas que serão promovidas até o fim da exposição, a fim de convocar outros artistas, profissionais de diferentes campos e o público em geral a compartilhar suas experiências na cidade e sugestões de soluções para os problemas que vivenciam. Dessa forma, Gabinete de Soluções é uma exposição ativada por encontros que consumam a ideia proposta em seu título.

Documentações

A reunião dos trabalhos expostos exalta a trajetória singular de um artista de grande importância para a formação do cenário artístico carioca dos anos 2000 e para a popularização das interferências urbanas no Rio de Janeiro. Transitando entre ações coletivas e espaços autônomos de arte, Guga Ferraz criou seus próprios circuitos e investiu contra a precariedade do sistema de arte no início do século. Inventividade e coletividade, características que marcam seu percurso, manifestam-se nesta exposição composta por suas táticas criativas de denúncia e seus projetos para a cidade, que borram limites entre arte e intervenção na esfera social.

[Texto curatorial da exposição Gabinete de Soluções – Guga Ferraz, realizada entre 7 de setembro de 26 de outubro de 2019 no Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica]

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